CINEMA PARISIENSE (1907)
Hoje, temos o prazer de iniciar o projeto “RioFilme: O Cinema Carioca Na Lente da História”. Faremos uma jornada pelos cinemas de rua cariocas, uma vez que rememorar esta trajetória é devolver ao presente as bases de um pensamento audiovisual que foi sendo amadurecido com o passar do tempo. A história do cinema brasileiro não se escreve sem uma referência obrigatória ao cinema carioca, pois foi na cidade maravilhosa, final do século XIX, a primeira sessão de imagens em movimento, como também, do primeiro grande cinema do Brasil em 1907. Assim, para inaugurar esta viagem no tempo, escolhemos uma joia rara, o Parisiense. Buscar essas memórias, além de legitimar as belezas ideológicas do movimento cinematográfico, permite que não caiamos no prejuízo cultural e intelectual do esquecimento.
No começo do século XX, com a grande reforma do prefeito Pereira Passos e o advento da Avenida Central – atual Rio Branco –, surgiu um novo polo cultural no Rio de Janeiro – anteriormente, concentrado na Rua do Ouvidor. E, com isso, os primeiros prédios de cinema foram instalados. Estes edifícios auxiliaram a modernizar a feição arquitetônica da cidade, uma vez que introduziram construções com mais de cinco andares, abrigando o público consumidor de filmes. Na época, a população era estimada em 1 milhão e 200 mil habitantes. Assim, víamos a evolução das pequenas salas de exibição para os grandes prédios de cinema.
Construído exclusivamente para exibição de filmes, o Parisiense foi inaugurado em 9 de agosto de 1907, no número 179 da então Avenida Central, e beneficiado pela eletricidade instalada primeiramente nesta avenida. O italiano Jácomo Rosário Staffa foi o precursor. Em uma viagem à Europa, ele viu o cinema sendo explorado comercialmente e pensou que poderia fazer a mesma coisa no Rio de Janeiro. Desafiando perspectivas contrárias, colocou seu sonho em andamento e construiu um grande sucesso que mudou os hábitos da cidade. Os filmes exibidos em sua primeira sessão foram: Uma Viagem na Birmânia, Heroísmo de um Comissário, Homem de (cabeça) de Borracha e Astúcias Conjugais.
O Homem com a Cabeça de Borracha (1901), Georges Méliès.
O programa foi muito elogiado pelo público. Além de novidades no gênero, eram filmes emocionantes e engraçados. O poeta Vinicius de Morais, crítico de cinema na primeira metade do século XX, afirma na Revista Clima de agosto 1944 que a primeira exibição de um filme brasileiro foi no Parisiense. As exibições eram diárias a partir das 6 horas da tarde até meia noite e, aos domingos e feriados, de 13:30h até meia noite. O cinema tinha 160 lugares e logo se tornaria pequeno pelo público que concorria às suas sessões – geralmente mais mulheres e crianças. Um fato curioso a ser relatado é que na época não havia censura, esta era feita pelos próprios exibidores. E foi Staffa certamente o primeiro a exercê-la. Segundo Alice Gonzaga, na matinée de 26 de setembro de 1926, o filme em cartaz era Viúva de Marinheiro. Por achar ser trágico demais para as crianças, ele foi substituído por Crianças Ingênuas.
Várias empresas exploraram o prédio do Parisiense, logo após J. R. Staffa, entre elas a Vital Ramos de Castro, a qual se deve um moderno edifício e a reforma sofrida em 1945. O prédio resistiu aos tempos, mas não como cinema. Atualmente funciona o Teatro Glauce Rocha e o Inacen, órgão da atual Secretaria Especial da Cultura do Governo Federal.
Cinema Parisiense, construído na Avenida Central, início do século XX. Arquivo: Cinedia. Fonte: Revista Filme Cultura, 1986
Imagem da Avenida Central, de um lado o cinema Parisiense e do outro o Cinema Central. Foto de Augusto Malta/Arquivo do MIS. Fonte: Revista Filme Cultura, 1986
NOTA
* Possivelmente omitido no programa o nome completo do filme, que na verdade seria “O Homem de Cabeça de Borracha” (1901) de George Méliès.
REFERÊNCIAS
- ARAUJO, Vicente de Paula. 1896: o cinematógrafo dos Lumière chegava ao Brasil. Revista Filme Cultura, n 47, agosto 1986.
- COSTA, Flávia Cesarino. O primeiro cinema. São Paulo, Scritta, Coleção Clássica, 1995.
- GONZAGA, Alice. Parisiense: Cinema na Avenida Central. Revista Filme Cultura, n. 47, agosto, 1986.
- MORAIS, Vinícius. “Crônicas para a história do cinema no Brasil”. Clima, n. 13, São Paulo, agosto de 1944, PP.9-18. APUD SOUZA, José Inácio de Melo. Imagens do Passado: São Paulo e Rio De Janeiro nos Primórdios do cinema. Editora Senac: São Paulo, 2019.
- VIEIRA, João Luiz e PEREIRA C.S Margareth. Cinemas cariocas: do Ouvidor à Cinelândia. Revista Filme Cultura, n 47, agosto 1986.